A possibilidade de prevenir o autismo infantil tem sido um tema cada vez mais debatido por estudiosos da psicanálise e das neurociências. Embora o autismo ainda seja um mistério em muitos aspectos, os avanços no conhecimento sobre o desenvolvimento psíquico e neurológico dos bebês abrem caminhos promissores.
Logo de início, o texto propõe a reflexão: “Seria possível a prevenção do autismo?”. Segundo A. Jerusalinsky (2012), negar essa possibilidade é assumir uma posição fatalista, seja acreditando que o autismo é exclusivamente genético e imutável, seja pensando que “as estruturas psíquicas da infância se constituem como causa definitiva e não modificáveis”.
A psicanálise, por sua vez, oferece uma visão que valoriza o papel da interação precoce entre o bebê e seus cuidadores como fator decisivo no desenvolvimento emocional saudável. Como destaca E. Laurent (2012), é essencial que a abordagem psicanalítica do autismo não seja esquecida, pois ela traz contribuições valiosas na compreensão dos aspectos relacionais e subjetivos envolvidos.
O artigo aborda o embate entre as explicações de base genética (ou organicista) e as que valorizam o ambiente e as relações humanas. Enquanto as correntes organicistas buscam identificar mutações genéticas, os psicanalistas focam na singularidade de cada história de vida.
Mesmo os psicanalistas reconhecem que fatores orgânicos podem estar presentes. Porém, como afirma A. Jerusalinsky, muitas vezes “quando este fator [orgânico] aparece, está ativado numa articulação psíquica especial”. Isso significa que, mesmo diante de uma predisposição genética, o meio ambiente tem um papel fundamental na manifestação ou não do quadro autista.
Diversos autores citados no texto, como Laznik (2004) e F. Tustin (1981), defendem que a intervenção precoce, especialmente no primeiro ano de vida, pode fazer grande diferença na trajetória de uma criança em risco para o autismo.
A psicanálise, por meio da sua escuta atenta, permite detectar sinais precoces de sofrimento psíquico no bebê. Como afirma Jerusalinsky: “Os psicanalistas que se ocupam de bebês e crianças pequenas têm muito a dizer sobre a detecção precoce do sofrimento desses bebês e também sobre as mudanças positivas decorrentes de suas intervenções clínicas”.
O texto dá grande ênfase à qualidade da relação inicial entre mãe e bebê. A interação afetiva, o olhar, a voz e o toque são fundamentais para a formação da subjetividade da criança. D.W. Winnicott (1956) reforça essa ideia ao afirmar que “não existe um bebê sozinho, só existe um bebê com sua mãe”, destacando que o desenvolvimento emocional é um processo contínuo e que lacunas nessa trajetória podem significar doença.
A depressão materna, segundo vários autores, é vista como um dos fatores de risco mais significativos para o desenvolvimento de quadros psicopatológicos, incluindo o autismo. Cullere-Crespin (2005) aponta que a depressão pode comprometer a capacidade da mãe de estabelecer um vínculo afetivo consistente com o bebê.
Além disso, F. Tustin (1981) ressalta que, muitas vezes, mães de crianças autistas enfrentam uma “enorme batalha interna contra sua própria depressão”, o que agrava ainda mais as dificuldades na relação com o filho.
Outros estudiosos, como P. Sanchez e M. Abelló (1981), destacam o poder da voz e do olhar maternos como “importantes organizadores psíquicos” que ajudam o bebê a construir sua subjetividade. A ausência desse olhar, por exemplo, pode deixar “um forte dano desde os primórdios do seu desenvolvimento”.
G. Haag (2007) também enfatiza o papel das expressões faciais e vocais na comunicação precoce com a criança autista, recomendando, inclusive, o uso de canções e lalações como forma terapêutica para romper o mutismo.
O texto faz questão de aproximar as descobertas da psicanálise e da neurociência. Hoje já se sabe que o ambiente pode influenciar diretamente a expressão genética, por meio de mecanismos conhecidos como epigenética. Como explicam Ansermet e Magistratt (2004), “a experiência deixa uma marca na rede neuronal, modificando a eficácia da transferência da informação”.
Essa plasticidade cerebral abre espaço para que intervenções precoces possam modificar trajetórias de risco. Courchesne (2011), por exemplo, mostrou que, mesmo em casos de alterações neuronais, o cérebro infantil tem capacidade de formar novas conexões graças às interações com a mãe.
Sabemos que os bebês são naturalmente frágeis e altamente dependentes do outro para a construção de sua subjetividade. Freud (1920) já dizia que “as experiências de satisfação deixam marcas que vão aos poucos formando um mapa de partes do corpo”, mostrando como os primeiros contatos sensoriais influenciam o desenvolvimento psíquico.
Estudos como os publicados na JAMA (2008) reforçam a ideia de que fatores ambientais estressores podem, junto com predisposições genéticas, aumentar o risco de desenvolvimento de psicopatologias como o autismo.
A boa notícia é que, ao conhecer esses fatores de risco, podemos atuar preventivamente. Como afirma o texto: “A intervenção precoce, essencial e indispensável para interromper um processo psicopatológico iniciado”.
A mensagem final do artigo é clara: conhecer os primórdios da vida psíquica, escutar os sinais de sofrimento do bebê e intervir precocemente pode fazer toda a diferença. Tanto a psicanálise quanto a neurociência apontam para um futuro onde a prevenção do autismo, ao menos em alguns casos, pode ser uma realidade.
Finalizando com uma importante reflexão de A. Jerusalinsky: “Os quadros autistas estão intimamente vinculados ao desequilíbrio do encontro do agente materno com a criança”, lembrando-nos de que a qualidade do vínculo inicial pode ser um fator decisivo.
A aposta da psicanálise é esta: com uma escuta especializada e intervenções cuidadosas, é possível transformar trajetórias de sofrimento em histórias de desenvolvimento e subjetivação.
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