O debate sobre “autistas falsos e verdadeiros” cresce nas redes sociais, mas é importante esclarecer: não existe autista falso. O que existe são diagnósticos bem realizados, diagnósticos incompletos ou equivocadamente atribuídos, muitas vezes devido à falta de avaliação multidisciplinar, presença de condições semelhantes ou interpretação incorreta dos critérios clínicos.
O Transtorno do Espectro Autista (TEA) é uma condição neurobiológica e permanente, reconhecida pela CID-11 e pelo DSM-5. Como o espectro é amplo, indivíduos podem apresentar diferentes intensidades de características, o que leva algumas pessoas a questionarem diagnósticos mais sutis. Porém, apenas profissionais especializados — psiquiatras, neurologistas e psicólogos — podem determinar se uma pessoa é autista, considerando histórico, observação clínica e instrumentos validados.
Por isso, em vez de tentar “reconhecer autistas falsos”, o foco deve ser entender como o TEA se manifesta, quais sinais podem indicar um diagnóstico legítimo e como funcionam os três níveis oficiais que medem a necessidade de suporte.
A popularização do tema nas redes sociais gerou a impressão de que muitas pessoas “viraram autistas de repente”. Isso acontece por alguns motivos:
Diagnósticos tardios: adultos que nunca tiveram acesso a avaliação adequada só recebem diagnóstico depois de grandes dificuldades emocionais e sociais.
Más interpretações do espectro: como há autistas altamente funcionais, algumas pessoas acreditam erroneamente que autismo só existe quando há deficiência intelectual ou comportamentos muito visíveis.
Condições que podem parecer autismo: TDAH, ansiedade social, TOC e dificuldades sensoriais podem confundir avaliações leigas.
Autodiagnóstico incorreto: algumas pessoas acreditam que são autistas apenas por identificarem traços, sem avaliação profissional.
Nenhuma dessas situações significa que alguém é “falso autista”, mas sim que é preciso cautela e conhecimento para compreender o espectro.
Embora o diagnóstico seja exclusivamente clínico, existem padrões frequentemente observados em autistas de diferentes níveis:
Dificuldade em compreender nuances sociais, ironias e duplo sentido.
Preferência por rotinas e previsibilidade.
Hiperfoco ou interesses restritos e intensos.
Sensibilidades sensoriais (som, luz, cheiro, toque).
Comunicação diferente, literal, direta ou com menor reciprocidade.
Dificuldade em interpretar expressões faciais ou regras sociais implícitas.
Esses sinais podem variar bastante — o que nos leva aos três níveis do espectro.
O DSM-5 classifica o TEA em três níveis, que indicam a intensidade do suporte necessário e não o “grau de autismo”. Isso significa que uma pessoa de nível 1 não é “menos autista” que uma de nível 3 — ela apenas desenvolveu mais estratégias de autonomia ou apresenta características menos limitantes no cotidiano.
Indivíduos de nível 1 conseguem completar atividades diárias com autonomia, mas apresentam:
Dificuldade em iniciar interações sociais.
Problemas em manter conversas ou compreender sinais sociais sutis.
Rigidez comportamental e resistência a mudanças.
Muitas vezes são confundidos com pessoas tímidas, excêntricas, altamente focadas ou socialmente “estranhas”, o que explica diagnósticos tardios.
Aqui, as características são mais visíveis:
Limitações claras na comunicação verbal e não verbal.
Dificuldades maiores para lidar com mudanças.
Comportamentos repetitivos que afetam o dia a dia.
Maior impacto em relações sociais, estudo ou trabalho.
Autistas de nível 2 podem precisar de adaptações escolares, terapias contínuas e suporte social mais estruturado.
É o nível com maior necessidade de apoio:
Comunicação limitada ou ausente.
Dependência elevada em atividades básicas.
Forte sensibilidade sensorial e comportamentos repetitivos intensos.
Dificuldades profundas na compreensão e uso da comunicação social.
Autistas de nível 3 normalmente precisam de acompanhamento contínuo, terapias específicas e apoio profissional diário.
Para não cair na armadilha de “achar que alguém é falso autista”, considere:
O espectro é extremamente amplo.
Cada autista é único.
Apenas avaliação profissional pode confirmar o diagnóstico.
Muitas pessoas mascaram sintomas (masking) para se adaptar socialmente.
Autistas de nível 1 não são “menos autistas” — apenas funcionam de modo diferente.
Promover informação correta sobre o autismo evita preconceitos, estigmas e diagnósticos tardios.
DSM-5 – American Psychiatric Association: https://www.psychiatry.org
CDC – Autism Spectrum Disorder: https://www.cdc.gov/autism
Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS/OMS): https://www.paho.org/pt